casamento de Ottilia vogt com Valentim Hentz |
Ottilia Hentz no dia do seu casamento |
OS LINDOS DIAS DA INFÂNCIA DE OTTILIA
Morgens Land
Era uma noite abafada de
outubro. Otília estava muito cansada e queria dormir cedo. Tinha, porém, ainda
uma tarefa a cumprir. Hoje era o seu dia de secar a louça. Quando, enfim, se
desincumbira deste seu último afazer, beijou a mãe e o pai, deu boa noite para
os irmãos e foi deitar. Fez as orações como sua mãe lhe ensinara e mesmo antes
de terminá-las adormeceu. Este tinha sido um dia cheio de afazeres para ela. Logo,
de manhã, fora para a aula. Ela morava longe, pelo menos meia hora de caminhada
por um pique através da mata virgem. No inverno tinha que atravessar o mato
ainda escuro, porém, agora, em outubro, já amanhecia mais cedo. Mesmo assim era
assustador cruzar aquele mato, podendo ser atacada por um bicho selvagem ou até
por um bugre como aconteceu com uma família lá em São Vendelino. Seu vizinho, o Butzen, que tinha voltado de Badenserthal, ouviu por lá a história
do rapto de uma família enquanto o pai estava fora de casa. A mãe de Otilia, no
entanto, tranquilizou a menina dizendo que os bugres não costumavam passar por
esta região de Morgens Land. Mesmo assim, as crianças estavam assustadas e por
isso andavam sempre juntas quando iam para a aula. Por sorte, em Morgens Land, moravam
quatro famílias e todas tinham, também, filhos em idade escolar. Ao todo eram
onze crianças. Assim a caminhada se tornava mais agradável e fazendo
brincadeiras, pulando e cantando até esqueciam os bugres. Antes de conhecerem a
história de São Vendelino as crianças tinham inventado uma brincadeira que
consistia no seguinte: Cada aluno tinha uma bandeirinha com seu nome escrito nela.
Em determinado ponto do caminho prepararam um lugar onde cada um fincava sua
bandeirinha quando ali passava. Desse modo os colegas, sempre, sabiam quem já
passara e quem ainda estava por vir. Agora, porém, por causa dos bugres, eles
andavam sempre juntos, num único grupo. Otília e mais dois irmãos seus, a
Ledvina e o Ignácio Floriano podiam esperar em casa até que todo o grupo se
reunisse, pois a sua casa era a primeira das quatro, de Morgens Land.
De manhã, Otília
despertou com o chamado da mãe. Era hora de levantar e dar conta de algumas
tarefas antes de ir para a aula. Despejou um caneco de água numa gamela e lavou
o rosto. Nesta hora o pai, a mãe e a Irmã mais velha, a Cecília, já estavam
tomando chimarrão sentados em torno de uma chapa com o fogo aceso e crepitando.
Quando o fogo crepitava assim a mãe costumava dizer que era sinal de visita.
Certamente alguém, neste fim-de-semana, viria passear. Talvez o Tio Florian que
era também seu padrinho.
Assim estava começando mais um dia para a
menina Otilia que, agora, já completara dez anos.
Ottilia estava aliviada
porque era sábado e amanhã, não precisaria ir para a aula e nem para a roça e,
afora algumas pequenas tarefas, o dia era livre para o que quisesse fazer. Em
geral toda a gurizada de Morgens Land se reunia no potreiro dos Gräf e
lá inventavam os mais diversos tipos de brincadeiras. Um arroio cruzava o
potreiro e uma das brincadeiras era pular por cima dele. Em alguns pontos ele
era mais largo e quem conseguisse pular ali era considerado o melhor. Em geral
quem ganhava essa disputa era o João Inácio, um dos filhos do Gäff. Ele era um
menino forte e grande, porém generoso e amigo de todos. Apartava as brigas que
aconteciam, se impunha e fazia justiça.