TRÊS FERRADURAS
Certa noite, há muitos anos,
meu irmão mais velho disse ter visto um fantasma. Viu três luzes pairando sobre
um banhado dentro do nosso potreiro. Nesta mesma época, trabalhava por aqui um negro que construía taipas. Chamavam-no “Schwartz Monuel” e era corcunda.
Ele disse que tais fogos apareciam onde tinha ferraduras enterradas.
A pesar de respeitar a
sabedoria popular que, em geral, encerra muita filosofia, sou cético em relação
a fatos extraordinários. Custo acreditar em milagres, crendices, fantasmas,
magias, forças do além e etc. Porém, o nosso folclore está tão cheio dessas crenças
que se fôssemos citá-las encheríamos várias páginas de um livro. Acho que a maioria das coisas
“extraordinárias” que acontecem em nosso entorno não resiste a uma
investigação séria.
Mas aquelas luzes
intrigantes, a toda hora, emergiam na minha memória até que fui procurar no
Google uma explicação que pudesse me satisfazer. Dizem os adeptos da internet
que lá se encontra tudo. Achei o seguinte:(Fogo-fátuo (ignis
fatuus em latim), também chamado de Fogo tolo ou, no interior do Brasil, Fogo corredor ou João-galafoice, é uma luz azulada que
pode ser avistada em pântanos, brejos etc. É a inflamação espontânea do gás dos pântanos (metano), resultante da decomposição de seres vivos.)
Essa é a explicação
científica. No entanto, a versão do negro corcunda não me saia da cabeça.
Estaria enterrada uma ferradura aí no banhado? Ou talvez três? Porque eram três
bolotas de luz duas maiores e uma menor.
Há alguns dias, o Eitor, que
é o atual proprietário, resolveu fazer daquele banhado um açude. Duas máquinas
trabalharam vários dias e removeram centenas de metros cúbicos de lama. Então
ele veio me contar que achou uma ferradura em meio àquela lama toda. Logo me
lembrei das três bolas de luz, da história do meu irmão e do negro corcunda.
Mas alguma coisa não estava batendo. Eram três luzes e uma ferradura.
Pasmem os prezados leitores que dois dias
depois o Eitor me procurou para dizer que achou mais duas ferraduras e uma
delas bem menor. Senti um calafrio
perpassar o meu corpo. Será que a versão do negro corcunda tinha algum fundamento?
Tudo se encaixava perfeitamente, a não ser um pequeno detalhe: a origem da
ferradura menor. Então os mais antigos me disseram que, uma vez, o Padre
Alfredo Bley vinha de São Pedro atender os fiéis da nossa comunidade montado no
lombo de um burrico. Ficava hospedado na nossa casa e o asinino era solto no
nosso potreiro. O enigma estava resolvido. A menor era uma ferradura do burrico
do Padre Bley.
Sei que é difícil, ao prezado leitor,
acreditar numa história dessas, mas quem duvida deve procurar o Eitor Hentz.
Inclusive ele me disse que vai fazer uma moldura onde ficarão expostas as três
ferraduras. Quem sabe esteja nascendo, aí, uma lenda: A “Lenda das Três
Ferraduras”. E talvez elas tragam sorte ao Eitor e a quem vier visitar o sítio
dele.
Mas eu continuo não
acreditando em fantasmas.
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