domingo, 23 de novembro de 2014

ENGAIOLADOS

Olhar pro céu e pensar em nada

Pra poder sentar na areia da praia sem ninguém por perto

E tem que ter espaço para balancinhos

balancinhos, que meu pai vai fazer. Desses de madeira, pendurados entre duas árvores.

 Aprender a suportar a nossa própria solidão.
Camila Lenk


Este texto é de Camila Lenk uma amiga do face e que publica seus escritos no seu blog

Engaiolados
Sempre achei estranha essa gente que tem medo do amor.
Daí que tenho observado muitos casos de gente que não quer se entregar, gente que se diz frustrada com os antigos relacionamentos,  ou que quer ser livre, ou ainda que tem  medo ou receio dos seus próprios sentimentos.
E, afinal, o que é ser livre?
Eu já fui livre tantas vezes estando vinculada à alguém.
E já me senti presa tantas vezes estando “sozinha”.
Ouço gente dizendo: "Quero ser solteiro, estou preocupado em ganhar dinheiro". Há controvérsias. Conheço histórias de pessoas bem sucedidas  que casaram precocemente. Souberam domar as artimanhas desse desafio.
E que graça teria uma casa  grande e linda, sem alguém pra dividir essa mansidão?
Ah claro, precisamos das nossas particularidades. E também do momento solitário. Só nosso. Pra poder sentar na areia da praia sem ninguém por perto. Olhar pro céu e pensar em nada. Aprender a suportar a nossa própria solidão.
Mas ter alguém que nos liberte de nós mesmos pode ser encantador.
Sempre imaginei num futuro, uma casa baixa (odeio apartamento que me prive do sabor da liberdade), com um terreno cheio de plantinhas e árvores. Árvores que eu plantarei junto com meu parceiro e filhinhos. Com um lago, de água cristalina. Sem peixinhos. Só a água purificada.  E patinhos em volta.
E a casa deve ser grande, sim, porque eu quero ter cachorros e dois filhos. E tem que ter espaço para balancinhos, que meu pai vai fazer. Desses de madeira, pendurados entre duas árvores. A casa será sempre cheia de sobrinhos. 
No entanto, os momentos a dois são necessários, revigorantes.  Uma taça de vinho e uma conversa saudável no final de um dia cansativo.
Há quem não tem planos de amor. Esses planos de viajar juntos, morar juntos, de viver juntos, de beijos no elevador, discussões fulminantes, mas sem quebrar quadros. Quebrando raivas, apenas.
Nenhum relacionamento vai ser igual ao outro. Cada pessoa, mesmo que parecida, é única. Comparações são equivocadas.
 O medo de amar é o pior dos medos! Não ama porque quebrou a cara no relacionamento anterior?  Não ama porque tem medo do replay ? Não ama porque ficou frustrado com a última psicopata que apareceu na sua vida? Não ama porque ele te traiu? Covardia!
O Medo pelo menos reage, mesmo que ofuscado e receoso. A Covardia tem essa maneira só dela de dar um passo e voltar. De voar sem cair. De aterrissar e não sair do lugar.
Quero viver numa gaiola aberta. Uma gaiola que caibam dois. Uma gaiola com a placa: "Seja livre, mas volte sempre que quiser".   
Odeio gaiolas fechadas. Odeio tudo que engaiola o vento e o sentimento.
 A liberdade é meu refúgio. Mas o amor é quem me acorrenta!

Camila


Quero viver numa gaiola aberta.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

VALORIZANDO NOSSAS RAÍZES

Elas são proprietárias do “Restaurante e Buffet da Zali”

Carine e Terezinha são filhas de Arvedo

Angst tinha uma casa comercial e uma queijaria em Cafundó. 

Angst tinha uma casa comercial e uma queijaria em Cafundó. 

Elas são proprietárias do “Restaurante e Buffet da Zali”

Elas são proprietárias do “Restaurante e Buffet da Zali”





VALORIZANDO AS NOSSAS RAÍZES
Cafundó.

Quem julgar essa localidade baseado no seu nome poderá pensar que se trata de um lugar horrível, na gíria, “onde o diabo perdeu as botas”, “ o fim do mundo” ou expressões equivalentes. No entanto, é um lugarejo aprazível que exibe uma natureza exuberante e é cercado por morros verdejantes que encantam o transeunte.
Em épocas passadas, era uma comunidade próspera com muitos colonos cultivando as terras que, a pesar de íngremes, possuíam um solo fértil de modo que onde se plantasse um pé de milho, com certeza, a colheita seria garantida. Lembro que havia uma expressão popular que dizia que os colonos de Cafundó plantavam o milho com a espingarda carregando as sementes num cartucho.
  A situação de Cafundó mudou porque a agricultura moderna foi descartando aquelas encostas acidentadas, por não permitirem a mecanização. Daí o êxodo rural foi inevitável tirando os moradores da localidade que foram procurar trabalho nas cidades próximas.
Por mais que queiramos fugir do nosso berço jamais nos livraremos das influências do meio onde nascemos e nos criamos.
 Em geral, as comunidades desse nosso interior são celeiros de indivíduos ilibados, graças à educação que receberam nas famílias e no meio onde aprenderam a serem pessoas de caráter e honradas.
De Cafundó saíram muitas famílias valorosas porém, hoje, quero me referir, de um modo especial, à família de Arvedo Angst. Angst tinha uma casa comercial e uma queijaria em Cafundó. Quando percebeu a inviabilidade econômica da localidade tratou de buscar novos horizontes. Vendeu sua propriedade em Cafundó e comprou a Rodoviária de Barão onde, também, mantinha um restaurante. 
Carine e Terezinha são filhas de Arvedo e herdaram do pai a vocação pelo ramo. Elas são proprietárias do “Restaurante e Buffet da Zali”, localizado na Rua Leonardo Celso Mombach 137, Barão, RS · Centro (51) 3696-2281.
O restaurante da Zali é o novo patrocinador desta coluna. Fico grato e, com certeza, será um investimento que trará bons resultados.

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

TIA CLARA E O VEXAME

A palha era descartada num local da propriedade
e durante muitos dias era motivo de brincadeiras e diversão para a gurizada.

Mais tarde, a prefeitura de Montenegro forneceu máquinas modernas tocadas a motor,
 facilitando a vida dos colonos.



 TIA CLARA E O VEXAME



Em épocas passadas, por todo este interior, os colonos, além de muitas outras coisas, também, semeavam trigo. As propriedades precisavam bastar-se tanto quanto possível. Hoje, ninguém mais pensa em cultivar este cereal. Os agricultores compram a farinha e muitas vezes, até o pão.
Lá no início da colonização, o trigo era trilhado com mangual. Depois, surgiu uma máquina tocada à força humana. Dois homens fortes giravam um equipamento que debulhava as espigas. O trigo saía junto com a palha sendo necessário, depois, separar a sujeira dos grãos. Era, ainda, um processo primitivo, trabalhoso e árduo.
Mais tarde, a prefeitura de Montenegro forneceu máquinas modernas tocadas a motor, facilitando a vida dos colonos. Mas a evolução não parou por ai.  Hoje, um único homem sentado com todo o conforto em sua ceifadeira faz o trabalho de centenas de trabalhadores braçais.
 Depois do trigo recolhido nas roças, a máquina passava pela comunidade e, mediante o pagamento de uma taxa, cada colono podia trilhar seu trigo. A palha era descartada num local da propriedade e durante muitos dias era motivo de brincadeiras e diversão para a gurizada.
Quando Tia Clara soube em que dia a trilhadeira passaria em nossa casa, deu um jeito de vir.
 Ela adorava estas ocasiões e sempre se mostrava muito prestativa.  Recolhia algumas espigas que os trabalhadores deixavam cair e recomendava que tivessem mais cuidado. Também, abria o saco para despejar o trigo debulhado.
 Na trilhadeira havia um ventilador que sugava o ar para produzir uma correnteza que separava os grãos da palha. Tia Clara, num momento de descuido, passou perto do ventilador que, juntamente com o ar, sugou, também, seu vestido e a saia de baixo (una rock) deixando-a só em trajes íntimos. Ela tinha muito pudor e ficou extremamente vexada com a situação. Todos tínhamos um grande carinho pela Tia, mas ninguém conseguiu segurar-se e a gargalhada foi geral. Diante da atitude de todos, ela saiu daí o mais rápido que pode. Não conseguia correr porque estava manca devido a uma sequela que ficara de um tombo que levou quando ia aprender a andar de bicicleta. Minha mãe acudiu-a e a conduziu para dentro de casa.
Depois de muito trabalho meu pai conseguiu desvencilhar o vestido do ventilador, porém não sem deixá-lo todo despedaçado. Tia Clara não saiu mais de dentro de casa naquele dia. Mais tarde nós, gurizada, fomos consolá-la. Dissemos que foi uma fatalidade. Que ela não teve culpa e que não ficasse aborrecida. Dissemos que a amávamos muito e que aquilo para nós significava nada.
 –Pois é, disse ela, mas todos riram de mim. Então pedimos desculpas.
 No dia seguinte ela já esquecera o fato e voltou a ser a Tia de sempre. O vestido que mamãe teve de emprestar-lhe ficou apertado nela, mas não houve outro jeito.
Quando embarcou no ônibus meu pai disse que ela deveria fazer um regime por que seu vestido estava apertado. Ela ainda quis responder, mas o ônibus já estava partindo e a porta fechada. Papai esperou o momento certo para mexer com ela. Nós só vimos o dedinho dela apontando na direção de papai, mas não pudemos mais ouvir os seus impropérios.
Quando o ônibus já havia partido tivemos que rir. Mamãe disse:
-Coitada!


domingo, 2 de novembro de 2014

A DIARREIA DA VACA

Então Aristides, muito prestativo, se ofereceu para fazer o meu trabalho




Tia Clara e de pé ao lado Aristides.

Então o ônibus parou em frente a nossa casa.





A DIAREIA DA VACA



Era verão e época de férias. Estávamos ansiosos porque Tia Clara viria nos visitar  e traria o Aristides, um dos filhos da família que morava na frente do terreno onde ela comprara os fundos e se construíra uma casinha. Ela morava lá há muito tempo e viu os filhos daquele casal crescerem. Ela os amava como se fossem seus próprios filhos.
Então o ônibus parou em frente a nossa casa. O Getúlio desceu primeiro para tirar as malas do bagageiro e, em seguida, o Aristides e, por fim, Tia Clara.  Subimos correndo para abraçá-los e ajudar com as malas onde, com certeza, a Tia também estaria trazendo presentes, coisa que ela jamais esquecia.

Naquele dia tivemos pouco tempo para brincar com o nosso amigo. Somente alguns chutes com a bola que fora um dos presentes da Tia. Nós não tínhamos muita habilidade com a bola, mas o Aristides era um craque. Fazia jogadas incríveis, nos driblava do jeito que bem entendia e empilhava gols um em cima do outro numa goleirinha que improvisamos no pátio da nossa casa. De noite a Tia nos contou que ele estava frequentando a Escolinha do Grêmio e tinha potencial para se tornar um craque e dar muitas alegrias à torcida tricolor.
 Tia Clara era gremista. Nós não sabíamos bem o que significava ser gremista, mas como ela era, então devia ser uma coisa boa e por isso todos nos tornamos, também, gremistas.
De manhã, levantamos cedo e, a pedido do amigo, fomos com a nossa irmã para a estrebaria onde ela tiraria o leite das vacas. Aí o Aristides, na sua ignorância de menino da cidade, queria saber o que era aquilo ali. Então lhe expliquei que era o banquinho para tirar leite. Por um momento ele ficou pensativo e então perguntou como fazíamos para sentar a vaca num banquinho tão pequeno. Rimos até não poder mais deixando o nosso amigo constrangido.
Mas a desgraça maior ainda estava por acontecer. Eu já ia me postar atrás da vaca para segurar o rabo dela para que ela não atrapalhasse minha irmã enquanto tirava leite. Então Aristides, muito prestativo, se ofereceu para fazer o meu trabalho porque isso era uma novidade para ele. De repente, a vaca deu dois passos para frente, com as  patas traseiras, encurvou a coluna e tentou levantar o rabo que Aristides segurava. Para o azar e a desgraça do menino a vaca estava com diarreia. O desfecho do episódio não vou contar porque o prezado leitor pode imaginar o que aconteceu. O nosso amigo estava desesperado. Foi despindo suas roupas melecadas e, enquanto corria para o banheiro, vomitou todo o café que acabara de tomar. Durante meia hora, ficou em baixo do chuveiro se esfregando com sabonete e passando perfume para tentar tirar o cheiro horrível que impregnava sua pele.
A desgraça do menino foi motivo para muitas risadas durante toda a semana. No começo Aristides se incomodava com as brincadeiras, mas, depois, levou na esportiva e ria também da experiência inusitada que vivenciara.
Na nossa infância nunca tivemos mordomias nem luxos e nem confortos. Trabalhávamos na roça desde pequenos e tudo era conseguido com muito trabalho e sacrifício. Porém, foram anos felizes e recordo, com saudades, deste e muitos outros fatos que ilustram a maneira saudável como fomos criados.