terça-feira, 27 de novembro de 2012

MEU PRIMEIRO GRENAL




MEU PRIMEIRO GRENAL








MEU PRIMEIRO GRENAL




  A Tia Clara nunca fora casada. Ainda jovem, foi trabalhar em Porto Alegre no hospital Santa Casa. Habituou-se à vida na cidade grande, mas jamais esqueceu a sua terrinha e os parentes que ficaram por aqui. Depois de aposentada, para o desespero de papai, vinha, seguidamente, nos visitar. Papai não gostava dela por que, dizia que ela metia o bico onde não era chamada.
 Tia Clara conseguiu comprar os fundos de um terreno. Lá construiu uma pequena casa onde morava desde há muito tempo.
- Pelo menos não preciso pagar aluguel, dizia orgulhosa.
Era muito amiga da família que morava na frente a ponto de chamar, de filhos, os dois meninos do casal. Eu conhecia bem os dois que, seguidamente passavam, nas férias escolares, vários dias na nossa casa.
Na última vez que Tia Clara nos visitou convidou-me para passar uns dias com ela.
Eram quatro horas da tarde, de um sábado ensolarado, quando cheguei a casa dela. Fui recebido com festa pelos dois amigos. De noite, dormi no quarto deles. Conversamos muito antes de dormir: aulas, passeios, plantação, cinema, televisão e até o mais velho falou de sua namoradinha, uma linda loirinha, segundo ele, sua colega na escola.
- O que faremos amanhã? Perguntou o mais novo.
-Vamos ver o Grenal, sugeriu o outro.
Assistir a um Grenal era para mim um verdadeiro sonho.
Já, de manhã cedo, preparei minha mochila. Levei uma almofada, um lanche e uma bandeira vermelha, a cor do meu time favorito.
Às duas horas, partimos. Assim que saímos de casa, um gato branco cruzou a rua na nossa frente.
- Sinal de sorte, pensei.
  Ao chegar ao estádio, fiquei atordoado com tanto reboliço. Vendedores, correria e empurrões. Nunca imaginara tanta gritaria e reboliço na entrada do estádio.
  Finalmente achamos um bom lugar nas arquibancadas. Sentamos todos juntos pois torcíamos para mesmo clube.
  O jogo começou. A torcida rugia a cada jogada bonita. Finalmente, já no segundo tempo, o gol. A metade do estádio explodiu num grito uníssono de entusiasmo. Vencíamos o grenal por um a zero. Perdi a noção de mim. A individualidade sumira. Eu fazia parte de uma grande alma grupal. Era um êxtase, um orgasmo coletivo.
 Aos poucos, quando a bola voltou para o centro do gramado, voltei a mim. O coletivo, novamente, cedeu lugar ao indivíduo. Então, mal a massa acordara do transe, o gol de empate. Ai foi a vez do outro lado.
  E o jogo parecia terminar no um a um. De repente, porém, o inesperado. Já nos acréscimos, a bola cruza a área e encontra a cabeça ágil do centroavante. E a rede balançou mais uma vez. A vibração da torcida foi indescritível. Um barulho ensurdecedor tomou conta do estádio. A bola no centro e o final do jogo. Tudo estava acabado.
  De noite na cama, lembrei do gato branco. Bem que mamãe, sempre, nos disse que nestas coisas não devemos acreditar.


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