segunda-feira, 21 de setembro de 2020

ALGUMAS RECORDAÇÕES DA INFÂNCIA.

                                 um dia nos convidou para uma audiência no seu rádio.

 

                      




ALGUMAS RECORDAÇÕES DA INFÂNCIA.

 

 

1 – Muitas vezes, no mês de dezembro ao por do sol, o horizonte se tinge de um vermelho intenso. É uma visão espetacular, e quando crianças, queríamos saber o que fazia o céu ficar assim. Nossos pais diziam que era coisa doPapai Noel cozinhando os doces que seriam distribuídos no Natal.

 

2- Muito cedo, as crianças, na colônia, já ajudavam nas lides da roça. Lembro que uma das minhas atribuições era fechar o breque da carreta ao descermos os morros íngremes da nossa propriedade. Meu irmão maior ia na frente conduzindo os bois e eu, atrás, abria ou fechava o breque conforme necessário. Era um trabalho de grande responsabilidade por que se eu falhasse os bois não conseguiriam controlar a velocidade da carreta e certamente aconteceriam consequências sérias da minha irresponsabilidade.

3 - Lembro, com saudade, das noites frias de inverno quando sob a luz de um lampião a querosene toda a família se reunia em torno do fogão a lenha. Comíamos pinhão assado na chapa e os mais velhos tomavam chimarrão.  Cantávamos canções populares e hinos religiosos.

Meu pai cantava no coral da comunidade. Em São Pedro, meu tio Francisco (te Hentz Franz), também cantava no coral e alguém trouxe um número da loteria que os cantores todos compraram juntos. Francisco, que era mais pobre, ficou ficou só com meia cota, e por isso ganhou só a metade do que os colegas ganharam, porém o suficiente para poder comprar um lote de terras melhor localizado e com melhores condições para o trabalho agrícola.

 

4 - Na escola jogávamos Barra ou Bandeira Velha. Aos domingos, pelos potreiros, procurávamos frutas silvestres: quaresmas (araticum), cerejas, pitangas e guabirobas. Com fundas, caçávamos passarinhos e procurávamos colmeias para chupar o mel. Num domingo encurralamos um tucano numa moita e nos postamos em torno dela disparando tiros de todos os lados até que um tiro atravessou a moita indo atingir a cabeça de Flávio no outro lado. O tiro partira da funda de Lauredo Erntzen. Por sorte, nada de grave aconteceu, pois, ao atravessar a moita, a pedra perdeu potência não causando danos significativos na cabeça de Flávio.

 

5 - Foi na casa de Orestes Scottá que ouvi rádio pela primeira vez. A propriedade de Orestes, hoje, pertence aos descendentes de Hugo Schommer, e parte da casa, durante muito tempo, serviu como paiol para a família Schommer. Antes, pertencia a Antonio Zan que era o nono (avô) de Teresa Maria Zan Manfredini, minha amiga e escritora. Orestes era o nosso vizinho e um dia nos convidou para uma audiência no seu rádio. O aparelho estava sintonizado na Rádio Difusora de Garibaldi. Lembro que ouvimos: “As Mocinhas da Cidade”, “Cana Verde” e propaganda de Pepsi-Cola.

 Esses primeiros rádios funcionavam com válvulas (hoje transístores) e por isso consumiam muita energia que era fornecida por uma bateria. (A energia elétrica ainda não chegara a Arroio). Por isso o aparelho ficava ligado o mínimo possível. Para carregar, a bateria tinha que ser levada “lá no Checo”, pai de Reinaldo Deitos que tinha um equipamento para tal fim movido por águas do arroio canoas. As baterias eram transportadas a cavalo dentro de um saco e se usava uma pedra como contrapeso. Havia, também, quem as transportasse em bicicleta. Mais tarde alguns compraram cata-ventos.

7 - O pessoal do “MORRO”: Lalo, Jandir, Negrim, Lori, Eloides, Verealdo e algumas vezes eu, o Plínio, o Lauri Henich(Pelé Branco) e outros nos reuníamos, depois do meio dia, para jogar futebol. Quando não tinha bola (em geral não tinha), jogávamos com laranjas ou enchíamos uma meia com panos velhos. Dessas peladas saíram bons jogadores como Jandir, Verealdo, Eloides e, principalmente, o Lalo que foi o melhor centroavante que a região já teve e só não se tornou profissional de sucesso por falta de oportunidade.

8 - Algumas vezes, nos dias de chuva, a gurizada era convocada para um trabalho extra. Os colchões, naquela época, eram um saco feito com tecido resistente. Deixava-se um buraco no centro por onde se introduzia palha de milho. Periodicamente essa palha era trocada. Aí a nossa tarefa consistia em rasgá-la em tiras finas. Em alemão, “lohb rope”. A cada dois ou três dias, a mãe ou as irmãs mais velhas introduziam a mão pelo buraco do colchão e afofavam a palha. Depois veio o colchão de crina. Hoje, as espumas substituem, com vantagem, aqueles colchões. Mas lembro, ainda hoje, do cheirinho aconchegante da palha de milho. Era muito gostoso deitar num colchão com palha novinha.

 

 

 

segunda-feira, 14 de setembro de 2020

UM CASAMENTO NO PARULHE EK

                                                                   Igreja de Boa Vista 


 

 

 

Versão em português de  "Ain Hohtzait in Parulhe Ek"

 

                                  UM CASAMENTO  NO PARULHE EK

 

Era sábado e a noiva estava feliz. Teve a grande ventura de encontrar seu príncipe. Celina, a noiva, era filho do Ubaldo Henzel que morava no Parulhe ek mas o casamento ocorreu em Boa Vista

Quem me contou a história foi meu irmão Nelson Hentz que foi professor em Boa Vista durante 15 anos. Naqueles tempos o professor era também sacristão, maestro, ministro da eucaristia, catequista, e quebra galho para qualquer imprevisto na comunidade.

 Padre José Scholl, vigário de Poço das Antas, foi o celebrante. Como meu irmão Nelson estava lá em cima na cantoria com seu coral, o senhor Flach Alvis foi o sacristão substituto.

O padre entoava:

- “ Dominus vobiscum”, ao que o coral de Nelson respondia:

- “Et cum Spiritu tuo”. (Na época as celebrações eram oficiadas em latim).

E tudo estava transcorrendo na mais perfeita normalidade até na hora das alianças. E foi aí que tudo aconteceu. A noiva teve um treco e desmaiou. Aos poucos foi despencando e não fosse o noivo segurá-la teria se espatifado no chão. Foi um tumulto, um reboliço de pessoas querendo ajudar, muitas mulheres com seus leques (o leque era moda na época) abanavam tentando reanimar a noiva, mas nada. Foi aí que a mãe da noiva gritou:

- Água, água... De fato, pensou Padre Scholl, água talvez resolva. Nisso já o sacristão substituto, o Senhor Flach Álvis, apareceu na cena com uma garrafinha. Entregou-a pro padre que derramou todo o liquido em cima da noiva.

Mas que infelicidade! Acontece que sobre a mesa da sacristia tinha ficado uma garrafinha com querosene que que o professor Nelson usava para abastecer um equipamento que se usava para acender as velas nos lugares mais altos do altar.

A noiva estava ensopada e o cheiro do querosene era insuportável. O ar irrespirável fazia as pessoas tossirem e, assoavam as narinas.

 Mas não teve jeito e a cerimônia teve que seguir assim mesmo até o fim a pesar dos protestos da noiva.

No final da missa havia muito para comentar. A noiva mesmo vexada acabou rindo da própria desgraça. O sacristão substituto culpou o professor Hentz por ter deixado a garrafinha com querosene na sacristia.

Então Padre Scholl interveio:

- Por que estão a discutir?  Por acaso o querosene não resolveu a situação?

 

domingo, 13 de setembro de 2020

A PROMESSA CUMPRIDA

                                                     comprei um cavalo e vim te pegar

                                                       Casal  Ana Margarida e João Vogt

                                                         

                                                                        Família Vogt
 

A PROMESSA CUMPRIDA

 

 

 

Otilia ia montada, junto com seu pai, num dos cavalos da família. No outro cavalo ia a filha mais velha, Cecília, levando na garupa a pequena Ledvina. Na subida do morro, Otília olhou para trás e chorou. Era um choro silencioso de lágrimas de grande tristeza. Estava deixando para trás a sua terra natal, os amigos e a escola onde conheceu Valentim. Talvez nunca mais o veria novamente. Mas a promessa que ele fizera enchia o coração da inocente menina: "quando crescesse compraria um cavalo e iria busca-la".

Valentim cresceu e se fez um rapaz saudável e forte.

 Era uma família numerosa pois, juntaram, sob o mesmo teto, os filhos do padrasto, Pedro, e de sua mãe Luiza.

Havia sempre muito trabalho na roça, porém, às vezes, sobrava algum tempo e isso permitia que Valentim fosse trabalhar na vizinhança o que lhe rendia alguns trocados que ele guardava.  

 Ao completar 18 anos seu padrasto emprestou o dinheiro que faltava, e ele pode comprar seu cavalo.

Era kerb na terra dos vogt.

Valentim teve sorte pois o cavalo que comprou era de boa estirpe, e por isso, em menos de três horas, já estava em Badenserthal. O baile já tinha começado. Amarrou o cavalo e entrou no salão.

 Lá estava ela conversando com as amigas. Valentim nunca mais tinha visto Otília, mas mesmo assim logo a reconheceu. Não era mais uma menina, mas sim uma mulher linda.

Os olhares se cruzaram e dois corações pulsaram em sintonia.

 Dançaram ao som da bandinha. Ao tê-la assim nos braços o mundo desapareceu. Valentim sussurrou ao ouvido dela:

- Comprei um cavalo e vim te buscar.

Os dois se olharam e riram. Ambos se lembravam da promessa.

Sem demora Valentim passou a frequentar a casa dos Vogt. Tinha um bom cavalo e em menos de três horas percorria o trajeto de Arroio Canoas a Badenserthal.

Valentim e Otilia casaram em agosto de 1928 em Badenserthal. Ambos tinham 22 anos.