Só de uma coisa não gostava. Botaram-lhe, no pescoço, uma coleira. |
Foi parido num dia frio e chuvoso de inverno por uma cadela de rua que revirava as latas de lixo |
Seu novo lar era uma pequena propriedade rural onde ele tinha espaço para correr e desenvolver todas as suas potencialidades. |
HÉRCULES
Ele era preto como a noite. Foi
parido num dia frio e chuvoso de inverno por uma cadela de rua que revirava as
latas de lixo a procura de algo para comer. Juntamente com ele nasceram mais
três irmãozinhos que, no entanto, não sobreviveram devido ao rigor do inverno
daquele ano.
Quando Miguel abriu a porta para
descer do carro um filhote de cachorro saltou para dentro e se escondeu debaixo
do banco. O pai de Miguel, às vezes, vinha para a cidade e naquele dia levou o
filho, de nove anos, para passar uns dias na casa de um primo.
O pai tentou tirar o filhote de
dentro do carro mas Miguel, usando todos os argumentos do seu repertório, conseguiu
convencer o pai a levar o cachorrinho para casa e adotá-lo.
Hércules, este foi o nome que o
menino escolheu, logo se adaptou a nova morada e cresceu forte e saudável. Seu
novo lar era uma pequena propriedade rural onde ele tinha espaço para correr e
desenvolver todas as suas potencialidades. Corria atrás de preás, caçava camundongos e pegava peixes num rio que tinha na propriedade e ia junto para a roça. Sua vida faria inveja a qualquer
cachorro.
Só de uma coisa não gostava; botaram-lhe, no pescoço, uma coleira. Acontece que às vezes ele tinha que ser
amarrado para não estragar alguma plantação ou, principalmente, quando uma
cadela na vizinhança entrava em cio. Então, toda a cachorrada comparecia e a disputa
pela cadela era acirrada. Várias vezes, Hércules voltou para casa todo
esfolado.
Quando Miguel soube que uma cadela
estava em cio, pegou o cachorro e o amarrou no para-choque do carro. A vovó,
sentada no seu quarto, da janela observava toda a movimentação, quando viu o pai
embarcar no carro. Imaginando o que estava prestes a acontecer, ainda, gritou
mas ninguém ouviu seus apelos. No início Hércules conseguia acompanhar, mas
logo o carro imprimiu velocidade e o coitado foi sendo levado de arrasto
estrada afora. A vovó, desesperada, correu para o telefone e ligou para o
vizinho que conseguiu parar o carro. Quando foram ver, só encontraram mais a
corda.
De noite Hércules voltou para casa
todo esfolado mas não sem antes passar na casa da cadela em cio. Soube-se, mais
tarde, que naquela noite ele ganhou o coração dela, não se sabe se por
merecimento ou por pena porque quando nasceram os filhotes, vários deles
nasceram com a cara, ou melhor, com o focinho dele. Hércules se recuperou do trauma e viveu,
ainda, por muitos anos tempo suficiente para conhecer e curtir seus filhotes e netinhos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário