São filhotes de chupim pedindo comida. |
Destroem os ovos do tico-tico e no lugar deles põem os seus, para serem chocados. |
O tico-tico é um passarinho que, com toda a certeza, vai para o céu. |
um ou dois passarinhos pretos piando de bico aberto atrás de um tico-tico. |
sempre tem o pátio e o jardim floridos com muitas e lindas flores. |
E ajudada pelo seu marido |
Norma e seu marido Arsenio Royer |
O CHUPIM.
Quem mora no interior, certamente já viu, no início do verão, um ou dois passarinhos pretos piando de bico aberto atrás
de um tico-tico. São filhotes de chupim pedindo comida.
A má fama desse
passarinho é notória.
Os chupins, para chocarem
seus ovos e criarem os filhotes, procuram, ninhos de tico-tico. Destroem os
ovos do tico-tico e no lugar deles põem os seus, para serem chocados. Algumas
vezes, na mesma ninhada, têm filhotes de tico-tico e de chupim. Essa atitude
deu-lhe fama de preguiço, explorador, desalmado e parasita. Por isso é xingado,
odiado e condenado por todos.
Foi isso o que aconteceu,
num domingo de tarde, quando a nossa família estava reunida sob um frondoso
cinamomo comemorando o aniversário da Tia Clara. Dois filhotes de chupim, com o
dobro do tamanho, perseguiam um tico-tico pedindo comida. O coitado, quando
encontrava um petisco, alimentava ora um ora outro. E ai, como não podia ser
diferente, o assunto era o chupim. O “vira-bosta”, como também é conhecido,
estava no banco dos réus. Só havia advogados de acusação. Todos viam, na
conduta do “vira-bosta”, motivo de condenação, e a sentença era morte. Quem a
proferiu foi Tia Clara ao dizer que um passarinho assim não merecia viver. Meu
pai, que dificilmente concordava com a Tia, endossou suas palavras e disse que
não se importava quando a gurizada matava um “Keilsreiter”. Só não queria que
matassem os joões-de-barro. Esses sim só faziam o bem.
Quando todos os
impropérios possíveis já haviam sido proferidos contra o réu, Norma, que é uma
pessoa afável e bondosa, e tem um coração de ouro, disse:
- O tico-tico é um
passarinho que, com toda a certeza, vai para o céu.
Fez-se, então, um
silêncio. A frase de Norma caiu sobre o mar de acusações como um balde de água
fria sobre a fervura. Cada um dos acusadores começou a repensar suas posições.
- Como podíamos condenar
o chupim sem conhecer a história desse relacionamento? Disse Tia Clara e
confessou, envergonhada, que sempre costumamos ver, somente, as coisas negativas
de um acontecimento. Então, Tio Ignácio que viera de São Salvador e que,
também, antes, fora um dos acusadores ferrenhos passou para o outro lado e com
ares de filósofo declarou:
-Não sabemos por que o
tico-tico se sujeita a essa exploração.
Será uma dívida com o chupim? Será um simples ato de amor? Não sabemos.
Nenhum de nós esteve lá no dia em que foi feito esse acordo. E é por isso que
não temos o direito de julgar. Durante milhares de anos esse relacionamento deu
certo. Quem somos nós para questioná-lo?
Aí, tio Ignácio elogiou a
Norma pela feliz observação a respeito do assunto. E perguntou se ela tinha
algo mais a dizer.
- Tenho sim, disse. Há
três coisas nesse mundo pelas quais eu tenho uma verdadeira paixão: Os
passarinhos, as flores e as crianças.
Durante a sua vida a Norma conviveu
intensamente com as suas três paixões. Tem dez filhos e um monte de sobrinhos e
netos que, também, a chamam de “Muti”. Mora em meio à natureza onde tem a
companhia dos passarinhos. E ajudada pelo seu marido, sempre tem o pátio e o
jardim floridos com muitas e lindas flores.
Certamente o prezado
leitor deve conhecer mulheres e homens como Norma. Não são doutores em
Teologia, não são professores nem catequistas, mas com a sua simplicidade e
sabedoria são capazes de nos legarem preciosidades como esta.