domingo, 27 de fevereiro de 2022

OS NOVE VARÕES Primeira parte

Michel com seus nove varões


A casa dos Hentz, em 1990, se mantinha teimosamente em pé   











Entrei pela porta da frente




                           A natureza estava tomando de volta o que lhe fora tirado  

 

 

 

 

OS NOVE VARÕES

Primeira parte

 

O pai dos nove chamava-se Miguel Simon Hentz (Michel) e a mãe, Maria Welter(Wälter).

Michel e Maria eram agricultores em Harmonia, um pequeno vilarejo, que, na época, pertencia ao município de Montenegro.

Maria teve 9 filhos homens, e a cada gravidez ansiava por uma menina que lhe ajudaria nas lidas domésticas aliviando o fardo que pesava sobre seus ombros.

-Paciência, o bom Deus só me mandou homens, dizia, com uma certa pitada de humor.

No início, Michel construiu uma casinha de madeira, mas agora, já com mais recursos, e vendo a família aumentando, tratou de construir uma casa maior. Era uma bela casa, em estilo enxaimel, ampla o suficiente para acolher a prole que vinham chegando.

 Conheci a casa por volta de 1990, quando fui visitar a propriedade. Ninguém mais morava nela e, apesar de abandonada, se mantinha, teimosamente, em pé. Na época, com algum investimento poderia ter sido restaurada. Há pouco, voltei ao local. O que vi me deixou comovido. Só havia mais ruínas. A natureza estava retomando o que lhe fora tirado. O telhado e várias paredes já tinham desmoronado, e o mato estava tomando conta. Fui tomado de forte emoção ao ver o estado de abandono. Aí estavam as ruínas do que foi a casa dos meus bisavôs Miguel Hentz e Maria Wälter.  Eles a tinha construído, e aí criaram sua família. Entrei pela porta da frente onda ainda tinha um pequeno pedaço de assoalho. Deixei me ficar por algum tempo, imaginando as cenas familiares de crianças brincando, do pai Miguel fazendo uma oração na mesa de refeições, e da vó Maria preparando a janta, lavando a louça, descascando aipim. 

Os filhos cresciam fortes e saudáveis e a mãe olhava orgulhosa os nove reunidos em torno da mesa. Tudo ia bem na família Hentz. O solo fértil do vale do Caí proporcionava boas colheitas. A produção era transportada até São Sebastião do Caí e lá embarcada em barcos que singravam pelo Rio Caí rumo a Montenegro, Porto Alegre e São Leopoldo. Em Montenegro havia o Frigorífico Renner. Os porcos eram transportados vivos até o matadouro localizado, estrategicamente, na beira do rio. Mais tarde foi criada a Cooperativa Rio Sul em Harmonia que passou a abater os suínos dos agricultores.

  No início Maria ia junto para a roça, mas agora, com a família crescendo, os afazeres domésticos ocupavam todo seu tempo. Imaginem o tamanho das panelas para fazer comida para nove bocas sempre famintas. Ela era sozinha: fazer pão, lavar roupa, limpeza, arrumar a casa, o galinheiro. Havia também um bando de gansos que Maria tirava as penas para fazer cobertas e travesseiros. Apesar da vida atribulada que levava, Maria era feliz até que uma desgraça se abateu sobre a família Hentz. Maria Wälter foi acometida por uma doença mortal. A mãe morreu deixando marido e os nove filhos.

Não se sabe exatamente a causa mortis de Maria. Na época, se morria de tuberculose, difteria(halskrankheit), tifo e de todo tipo de doenças infecciosas. Não se conhecia antibióticos.  Miguel caiu em desespero. Os filhos mais velhos já estavam criados, mas os mais novos ainda eram crianças.

Precisava de uma mulher para ajudar na criação dos mais novos. Uma viúva lhe foi apresentada pelo padre. No desespero casou com ela.

- Este foi o maior erro do vô Miguel - disse Hilda Wolf - quando a entrevistei por volta de 1990.

 

 

 

domingo, 6 de fevereiro de 2022

UM CASAMENTO NO PARULHE ECK

 




 

 

Como prometi na edição passada, aqui vai a versão em português do texto em Hunsrik.

 

 

                                  UM CASAMENTO NO PARULHE ECK

 

Era um sábado insolado em “Parulhe Eck”, e a noiva estava feliz. Ia casar-se com o grande amor de sua vida.

Quem me contou a história foi meu irmão Nelson Hentz que foi professor em Boa Vista durante 15 anos. Naquele tempo, o professor acumulava várias funções: sacristão, maestro, ministro da eucaristia, catequista, enfim, quebra-galho para qualquer imprevisto na comunidade.

 Padre José Scholl, vigário de Poço das Antas, foi o celebrante. Como meu irmão Nelson estava lá em cima na cantoria com seu coral, o senhor Flach Alvis, naquele dia, foi o sacristão substituto.

O padre entoava:

- “ Dominus vobiscum”, ao que o coral de Nelson respondia:

- “Et cum Spiritu tuo”. (Na época as celebrações eram oficiadas em latim).

E tudo transcorria na mais perfeita normalidade até a hora das alianças quando tudo aconteceu: A noiva teve um treco e desmaiou. Aos poucos foi despencando e não fosse o noivo segurá-la teria se espatifado no chão. Foi um tumulto e um reboliço de pessoas querendo ajudar. As mulheres com seus leques (o leque era moda na época) abanavam tentando reanimar a noiva, mas nada. Foi aí que a mãe da noiva gritou:

- Água, água... De fato, pensou Padre Scholl, água talvez resolva. Nisso já o sacristão substituto, o Senhor Flach Álvis, apareceu na cena com uma garrafinha. Entregou-a pro padre que derramou todo o liquido em cima da noiva.

Mas que infelicidade! Acontece que sobre a mesa da sacristia tinha ficado uma garrafinha com querosene que que o professor Nelson usava para abastecer um equipamento que se usava para acender as velas nos lugares mais altos do altar onde, com as mãos, não se alcançava.

A noiva estava ensopada e o cheiro de combustível era insuportável. O ar irrespirável fazia as pessoas tossirem e, assoavam as narinas. Muitos correram para fora para vomitar.

 Quando a noiva recuperou os sentidos a cerimônia seguiu até o final.

Depois da missa houve muito cochicho. À boca pequena, as fofoqueiras faziam comentários maldosos. Entre outras coisas insinuavam que a noiva estava grávida, o que na época era um vexame.

Depois, na sacristia, houve um “bate-boca”: O sacristão substituto culpou o professor Hentz por ter deixado a garrafinha com querosene na sacristia.

 Então Padre Scholl interveio:

- Por que estão discutindo?  Por acaso o querosene não resolveu a situação?!!